Crônica de Despedida a Hermeto

Crônica de Despedida a Hermeto
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“A Relíquia de Dez Cordas”

Pouca gente sabe, mas Curitiba também guardou, por um tempo, os passos de Hermeto Pascoal. Ele viveu aqui com a cantora Aline Morena, e mesmo nesse canto do mundo, entre frio e pinheirais, continuava a inventar música como quem respira. Hermeto não precisava de muito: uma chaleira, um copo com água, ou apenas o silêncio – tudo virava som. Foi assim que nasceu, inclusive, uma de suas obras mais ousadas, o Calendário do Som, prova de que cada dia pode ser música.

Tive a sorte de conhecer o homem por trás do mito. Não apenas o multi-instrumentista reverenciado nos quatro cantos do planeta, mas o amigo. De vez em quando nos encontrávamos para conversar – e falar de música, claro. Hermeto falava de notas como quem fala de estrelas: sempre havia mais uma a ser descoberta, mais uma possibilidade escondida no infinito.

Lembro com carinho das noites na casa do grande Ceará, do Calamengau. A cozinha exalava sabores que se misturavam às gargalhadas. A mesa ficava cheia de causos, improvisos e histórias. No meio disso, Hermeto, com aquele jeito de mestre e menino ao mesmo tempo, sempre pronto a transformar qualquer barulho em sinfonia.

Hoje, ao me despedir, é essa imagem que guardo: o Hermeto humano, generoso, brincalhão. O amigo que ria fácil, que fazia da vida um palco de experimentos e da música um abrigo para todos.

Ele partiu, mas sua genialidade fica espalhada como as notas que soltava no ar – livres, eternas, impossíveis de apagar. E a viola de dez cordas dele e de Aline, que a mim foi presenteada, guardarei como relíquia.

Fonte:     www.brasilcultura.com.br


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