Política externa de Trump preocupa Japão e Coreia do Sul

Política externa de Trump preocupa Japão e Coreia do Sul
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Aliados tradicionais dos EUA na Ásia temem ser preteridos em disputas com a China e perder apoio decisivo de tropas americanas caso Pequim tente se impor militarmente sobre Taiwan

Japão e Coreia do Sul temem pacto entre EUA e China; na foto, registro de encontro entre Xi Jinping e Donald Trump em outubro

Há uma preocupação crescente no Japão e na Coreia do Sul de que a postura do presidente americano Donald Trump em relação à Ucrânia e à China faça parte de uma política externa geral de “toma lá, dá cá”, que pode acabar desestabilizando alianças de longa data no nordeste da Ásia.

O recente “plano de paz” de 28 pontos do governo Trump para a Ucrânia revelou-se uma reprodução de exigências maximalistas já apresentadas pelo Kremlin. E embora as negociações ainda estejam em andamento e uma versão mais moderada do plano tenha sido proposta, o governo Trump sinalizou diversas vezes que está disposto a abandonar a Ucrânia.

Quanto à China, o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, afirmou que Trump pretende se reunir com o líder chinês Xi Jinping até quatro vezes ao longo de 2026, incluindo uma visita de Estado a Pequim em abril e uma visita recíproca aos EUA no final do ano. Bessent disse que os encontros dariam “grande estabilidade” à relação bilateral. Trump tem tentado suavizar os laços com Xi após deflagrar uma dura guerra comercial com o gigante asiático.

Oficialmente, Seul e Tóquio — os dois aliados mais próximos de Washington na Ásia — permanecem em silêncio. Mas para muitos observadores no Japão e na Coreia do Sul, a política externa da Casa Branca em relação à guerra na Ucrânia é sinal de que Trump apoia os esforços de Vladimir Putin para subjugar um vizinho menor na Europa. E isso os deixa ainda mais receosos de que o mesmo ocorra com a China e Taiwan .

Trump se aproximando de ditadores?

“A traição da Ucrânia por Trump pesa muito sobre a Ásia e os aliados dos Estados Unidos  na região, que agora questionam a confiabilidade de suas alianças com Washington”, afirma à DW Jeff Kingston, diretor de Estudos Asiáticos da Temple University em Tóquio.

“Japão e Coreia veem Trump se aproximando de ditadores autoritários na Rússia, China e Coreia do Norte, enquanto os pressiona no comércio, e se perguntam o que acontecerá em caso de uma contingência envolvendo Taiwan”, destaca.

Kingston afirma que a primeira-ministra japonesa Sanae Takaichi provavelmente ficou “desapontada” por Trump não ter demonstrado apoio imediato durante uma recente disputa com Pequim.

Ao fazer seu primeiro discurso ao Parlamento, Takaichi respondeu a um colega que a interpelou que qualquer intervenção armada chinesa contra Taiwan seria uma “ameaça existencial” ao Japão passível de resposta militar.

Pequim reagiu exigindo que Tóquio se mantivesse fora dos “assuntos internos” da China e, dentre outras providências tomadas, desaconselhou chineses a viajar ao Japão, atrasou o lançamento de filmes japoneses e cancelou eventos culturais e intercâmbios.

Takaichi não quis voltar atrás em suas declarações, mas há relatos de que foi advertida em ligação com Trump no final de novembro a não “provocar” Pequim.

Japão e Coreia do Sul decepcionados?

Para Kingston, a postura de Trump em relação ao Japão pode ter decepcionado a premiê. “Após o sucesso da recente visita de Trump a Tóquio e o compromisso de Takaichi com investimentos nos EUA, acho que ela esperava algo mais”, avalia. “Ela gostaria que Trump declarasse que o Japão é a ‘pedra angular da paz’ na região e reforçasse a força da aliança.”

Segundo o especialista, o receio do Japão agora é de que EUA e China criem um “G-2” que “passe por cima do Japão e mostre como Tóquio está perdendo influência”. A mesma preocupação também afligiria a Coreia do Sul.

Takaichi e Trump durante visita do americano a Tóquio em outubro

Enquanto isso, o Japão cedeu às exigências de Trump para investir 550 bilhões de dólares (quase R$ 3 trilhões) em indústrias americanas, e Seul concordou em fornecer 350 bilhões de dólares (R$ 1,9 trilhão) em investimentos diretos e mais 150 bilhões de dólares (R$ 815,9 bilhões) em cooperação na construção naval.

“Claro que foi injusto e claro que as pessoas estão insatisfeitas, mas também reconhecemos que a Coreia do Sul é muito dependente dos EUA”, comenta Lim Eun-jung, professora de estudos internacionais na Universidade Nacional de Kongju.

Lim ressalta que embora o atual presidente sul-coreano, o esquerdista Lee Jae-myung, não seja um parceiro nato para o governo Trump, ele também é um “pragmático” quando se trata das alianças do país.

Coreia do Sul teme perder proteção de tropas americanas

Seul está atenta à crescente agressividade da China na região, especialmente à sua constante incursão em águas disputadas no Mar Amarelo, que lembra a tomada, há dez anos, de atóis e águas adjacentes no Mar do Sul da China.

Lim diz que a Coreia do Sul não sabe quanta atenção a Casa Branca tem dado a essa disputa ou se o governo Trump viria em seu auxílio caso necessário. O país também teme que Trump, “como parte de sua postura transacional em relações internacionais”, reduza ou retire as tropas americanas na Coreia do Sul, explica ela.

Trump ainda não ameaçou, em seu segundo mandato, reduzir as tropas americanas na Coreia do Sul caso Seul não pague mais para manter as forças no país. No entanto, a pressão por pagamentos foi uma alavanca que Trump tentou usar durante seu primeiro mandato e continua sendo algo a que ele pode recorrer.

O Japão também teme algo semelhante, embora Takaichi possa ter evitado parte dessa pressão ao anunciar que o orçamento do próximo ano elevará a 2% do PIB os gastos com defesa.

Mas não está claro se esse aumento será suficiente para Trump.

Em entrevista recente à Fox News nos EUA, o americano foi questionado se a China era uma “amiga” dos EUA, no contexto da disputa entre China e Japão.

“Muitos de nossos aliados também não são nossos amigos”, respondeu Trump. “A China nos explorou muito […], nossos aliados nos exploraram mais no comércio do que a China.”

Fonte:    www.dw.com.br


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